As novas tecnologias de Inteligência Artificial têm levado a discussões éticas porque impactam setores da economia e a atividade humana, promovendo uma verdadeira transformação em nível global.
1. O que está em discussão?
A necessidade de as tecnologias exponenciais terem uma estrutura regulatória global surgiu do grande impacto que suas soluções causam na vida dos seres humanos. Sem dúvida, a IA já demonstrou sua utilidade em meio à crise pandêmica, processando grande volume de dados (Big Data), viabilizando tecnologias de teste, rastreamento, análises preditivas, viabilizando plataformas digitais para diferentes usos, principalmente na saúde. Agora, os Estados-membros da Unesco aprovaram a 1ª Recomendação sobre ética na aplicação da IA. A questão é tão significativa que até mesmo grandes corporações de tecnologia mantém comitês de ética sobre IA.
2. Por que há dúvidas sobre o uso ético da IA?
As tecnologias de IA estão criando novos benefícios e melhorando a vida das pessoas. Contudo, a capacidade das máquinas de aprender e ampliar esse conhecimento com base nos dados que coletam para executar determinadas tarefas precisa assegurar transparência no sentido de não atingir a privacidade e intimidade das pessoas, direitos constitucionalmente garantidos. É quase inevitável que deixemos pegadas sobre os nossos dados na maioria das atividades que desenvolvemos diariamente.
3. Quais são os principais desafios?
Estabelecer diretrizes para a Inteligência Artificial, mas que não comprometam sua evolução. A Unesco conseguiu criar uma Recomendação com tópicos básicos, que vão ajudar a propiciar mais transparência às tecnologias, sintonizando-as com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU. Entre os desafios estão evitar que sejam invasivos, promovam pontuação social (monitoramento de indivíduos com base em seu comportamento, que gera pontuações positivas e negativas) e violação dos direitos humanos. Em contraponto, precisam ter um desenvolvimento saudável, capaz de auxiliar áreas novas e fundamentais, como o combate às mudanças climáticas.
4. O que a Recomendação da Unesco propõe?
Avaliar o impacto dessas tecnologias sobre a sociedade, os indivíduos e o meio ambiente e buscar parâmetros para mensurar se os Estados estão preparados em termos técnico, jurídico e regulatório. Nessa questão, entram orientações sobre proteção de dados e vigilância em massa. Incentiva que os países tenham um Oficial de Ética de IA, independente, para supervisionar os dados de IA para evitar riscos e danos e, quando ocorrerem, possam assegurar responsabilização e reparação.
5. Como está a regulamentação no Brasil?
A Câmara dos Deputados aprovou em outubro o substitutivo ao PL 21/2020, do deputado Eduardo Bismarck, que estabeleceu o Marco Legal do Desenvolvimento e Uso da Inteligência Artificial no Brasil. Alguns pontos éticos estão previstos no texto, como a IA ter finalidade benéfica, centralidade do ser humano, não discriminação, busca pela neutralidade, transparência, segurança e prevenção, inovação responsável e disponibilidade de dados.
6. O debate sobre ética e IA também vem ocorrendo na advocacia?
Sim, em novembro, por exemplo, a LBCA (Lee, Brock, Camargo Advogados) realizou em parceria com o portal Migalhas um seminário sobre o “ Marco Legal da IA”, que contou com a presença do deputado Bismarck, de especialistas, acadêmicos e empresários. O evento deixou claro que o debate tem um longo caminho a evoluir e conta com posições plurais, nem sempre consensuais.