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Aspectos jurídicos sobre os desafios da flexibilização da Telemedicina diante da crise da Covid-19

Aspectos jurídicos sobre os desafios da flexibilização da Telemedicina diante da crise da Covid-19

A Telemedicina pode ser conceituada como todo esforço organizado e eficiente do exercício médico à distância que tenha como objetivos a informação, o diagnóstico e o tratamento de indivíduos de forma isolada ou em grupo.

Desde que baseado em dados, documentos ou outro qualquer tipo de informação confiável, sempre transmitida através dos recursos da telecomunicação.

Assim como o home office se tornou uma realidade diante da necessidade da manutenção das rotinas de trabalho dentro de um mundo interligado tecnologicamente, a medicina também assume papel importante diante deste novo cenário, apesar de não ter sido amplamente regulamentada do ponto de vista jurídico no país.

As vantagens desta modalidade podem ser descritas pelo aumento da penetração do atendimento dos médicos em locais remotos, bem como o atendimento à população cada vez mais idosa, sem a necessidade de deslocamento, fato também aplicável aos pacientes crônicos e com caráter degenerativo.

No atual cenário pandêmico, a telemedicina ganha ainda mais importância por viabilizar o acesso a meios tecnológicos que não estão disponíveis em todo o planeta e, no caso brasileiro, viabiliza o acesso à informação e aos procedimentos de diagnóstico (teleconsulta) de forma ágil e consistente a todos os rincões do país que hoje estão em maior risco diante do Covid-19.

Neste sentido, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou no dia 19 de março, por meio do Ofício n.º 1756/2020-Cojur, a flexibilização dos procedimentos de Telemedicina (teleconsulta) para permitir aos médicos o uso excepcional deste tipo de ferramenta de modo a  garantir a menor circulação de pessoas e a exposição ao vírus, permitindo o atendimento pré-clínico, suporte assistencial, consulta, monitoramento e diagnóstico.

O Ministério da Saúde, na sequência, publicou no Diário Oficial da União do dia 23 de março, a Portaria n.º 467/2020 para regulamentar atendimentos médicos à distância, sendo que a Telemedicina está liberada excepcionalmente durante o período de pandemia.

O primeiro desafio que se observa é o advindo do parágrafo único do artigo 2°, o qual consta que o atendimento liberado pela Portaria deve se dar diretamente entre o médico e o paciente, por meio de tecnologia da informação que garanta a integridade, segurança e o sigilo das informações.

Nota-se que os conceitos de integridade, segurança e sigilo das informações são conceitos abertos, que dependem da interpretação e análise no caso concreto para se mensurar o nível de proteção das informações, de modo a sempre garantir o a relação individual e confidencial médico-paciente.

Ou seja, os níveis de integridade, segurança e proteção das informações podem ter um nível determinado em um hospital e podem ter outro nível desejável em uma clínica particular.

Outro desafio que se observa é o relativo ao registro do atendimento ao paciente por meio da função telemática, eis que, segundo o artigo 4º, o atendimento deverá ser registrado em prontuário clínico que deverá conter: (I) dados clínicos necessários para a boa condução do caso, sendo preenchido em cada contato com o paciente; (II) data, hora, tecnologia da informação e comunicação utilizada para o atendimento; (III) número do Conselho Regional Profissional e sua unidade da federação.

Neste sentido, todas as informações transmitidas pelo paciente ao médico consultado só terão respaldo se elas forem permitidas por aquele que, de forma livre e consciente, deu seu consentimento livre e esclarecido ou pelos seus responsáveis legais, com exceção, dos casos de comprovado perigo de vida.

Logo, o consentimento deve ficar registrado no momento da teleconsulta para depois poder ser comprovado futuramente.

Do outro lado, nos mesmos termos da Lei Geral de Proteção de Dados, a segurança da informação e dos dados pessoais do paciente, considerados dados sensíveis pela Lei n.º 13.709/2018, devem ser protegidos de acessos de terceiros, inclusive de outros médicos que não participaram da teleconsulta, devendo se impor todas as medidas de segurança e governança da informação para que não ocorram incidentes indesejados.

Motivo pelo qual os médicos que aderirem a esta modalidade devem se assegurar que este meio possui uma estrutura capaz de assegurar que: (I) o paciente entendeu as orientações; (II) que o ambiente telemático é seguro e (III) havia meios eficazes para realizar o diagnóstico.

Necessário se destacar que o médico não se desvincula de suas responsabilidades pelos maus resultados advindos do uso deste recurso, seja na conclusão do diagnóstico ou de seu tratamento, mesmo quando entender que sua responsabilidade é limitada pela quantidade ou qualidade das informações prestadas pelo paciente.

Para tanto, é fundamental que o médico comprove que recebeu tais informações, sendo imprescindível que o médico se atente ao registro da comunicação para que sirva como meio de prova, posteriormente, se for o caso.

Outro ponto que merece ênfase é a questão ética que ainda não foi regulamentada à exaustão de modo a regular, por meio de normas de conduta, a telemedicina.

Há necessidade premente de se respeitar a dignidade do paciente sem que a necessidade da presença deste fisicamente seja necessária para se garantir a confidencialidade, a proteção dos dados pessoais e a integridade das informações de modo que esta modalidade seja escalável de um modo seguro a todos os envolvidos.

Um exemplo de debate que hoje se eleva é a questão do uso de dados de geolocalização de pacientes para rastreio e monitoramento do Coronavírus como forma de política pública de saúde em diversos países como Coréia do Sul, Singapura, China e Estados Unidos.

Neste último país, membros do legislativo indagam como seria o armazenamento, tratamento e o processo de anonimização para garantia dos interesses dos titulares dos dados.

Diante deste cenário, observa-se que as recentes flexibilizações da telemedicina no Brasil representam importante avanço no cotidiano médico e um grande reforço no combate da pandemia, mas que, entretanto, possui desafios práticos importantes para que seu escopo seja alcançado com o máximo de eficácia dentro das regras de direito existentes e dos princípios médicos, os quais merecem amplo debate.

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