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O impacto das medidas fiscais adotadas pelo governo para o futuro da economia em 2020

O impacto das medidas fiscais adotadas pelo governo para o futuro da economia em 2020

Imagine, há um ano, fazer uma previsão sobre o que aconteceria nesse mês de abril? Você acreditaria que estivesse tudo parado, com uma crise bem maior que a de 2008? Seria algo completamente fora da curva. Foi tudo por água abaixo, inclusive a política econômica do Ministério da Economia até então.

Em pouco mais de dois meses, o cenário para 2020 é totalmente imprevisível. Ainda mais num momento em que as vidas de milhares de brasileiros estão em risco por conta da pandemia. A questão econômica ficou para o segundo plano e a ordem é liberar dinheiro para atravessar esse período de quarentena.

Mas já dá para adiantar algumas questões importantes, de acordo com os especialistas e institutos especializados. Um levantamento do The Economist Intelligence Unit, que faz análise de mercados financeiros em todo o mundo, estima que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caia 5,5% em 2020.

Os números do relatório, que estima quedas em praticamente todas as grandes economias mundiais, foram usados inclusive pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, numa apresentação feita no último sábado (4) no evento virtual XP Live Conference. Ele usou as projeções para analisar o cenário macroeconômico brasileiro.

Para o economista Roberto Dumas, especializado em mercado financeiro e mercados asiáticos, esse não é o único número ruim da economia em 2020. Ele não é nada otimista quando o assunto é o índice de desemprego do país.

“Deve crescer bastante, mas não agora, no fim do ano, quando os incentivos governamentais terminarem”, diz. A taxa atual de desocupados é de 11,6%. Ele acredita que deva subir para pelo menos 15%.

“Os balanços das empresas em dezembro de 2020 deverão ser ruins. Nesse momento, elas vão perceber que o lucro acumulado despencou e não terão dinheiro para investir na produção. Aí será a hora em que elas vão demitir”, afirma.

Os dados do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre) estimam um desemprego ainda maior, de 16,1% já neste trimestre. Isso significa que 5 milhões de brasileiros vão entrar na fila do desemprego durante a crise.

Orçamento de guerra

Na última sexta-feira (3), a Câmara dos Deputados aprovou em primeiro e segundo turnos o chamado “orçamento de guerra”, que permite a separação do orçamento e dos gastos realizados para o combate à pandemia de coronavírus do orçamento geral da União.

As regras terão vigência durante o estado de calamidade pública, e os atos de gestão praticados desde 20 de março de 2020 serão convalidados. A intenção da proposta é criar um regime extraordinário para facilitar a execução do orçamento, relacionado às medidas emergenciais.

O projeto ainda não foi aprovado, precisa passar pelo Senado em dois turnos, e é um dos grandes destaques desse começo de semana. Especialistas acreditam que ele deve ser aprovado sem dificuldades, o que dá ao governo a segurança jurídica para aprovar despesas emergenciais com rapidez e enfrentar a crise causada pela interrupção da maioria das atividades, além da adoção de novas medidas econômicas.

Caso aprovado, o orçamento facilita gastos e contratações, através de um Comitê de Gestão da Crise, chefiado pelo presidente Jair Bolsonaro. O texto anterior previa que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, chefiasse esse comitê, mas foi alterado a pedido do governo.

Mas não pense que a medida é uma “carta branca” ao governo e ao Banco Central. O Congresso e o Supremo Tribunal de Justiça (STF) poderão vetar as decisões em caso de alguma irregularidade. O projeto ainda prevê a edição de uma norma complementar, estabelecendo como será feita a contratação de pessoal, compras e serviços, para que tudo seja feito de forma mais rápida e simplificada, algo importante nesse momento de emergência.

Para realizar as despesas necessárias, o governo poderá, nesse momento, fazer emissões para a execução dos gastos, sem a limitação imposta pela chamada Regra de Ouro. E aí o Banco Central fica autorizado a comprar dívidas de empresas no mercado e títulos do Tesouro Nacional.

De acordo com representantes do BC, as medidas já anunciadas até aqui têm o potencial de ampliar a liquidez do Sistema Financeiro em R$1,2 trilhão, equivalentes a 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.

Ainda de acordo com o banco, outras medidas adotadas para relaxar as exigências de capital das instituições financeiras têm o potencial de ampliar a oferta de crédito em R$1,16 trilhão, ou 15,8% do PIB.

Para Caio Tenório, advogado do escritório Lee, Brock & Camargo Advogados (LBCA), três pontos precisam ser considerados em relação ao orçamento de guerra. O especialista acredita que ele não pode ser uma desculpa para que o governo não pague os R$ 600 para os informais e a população mais vulnerável. Ele critica a demora do governo em fazer chegar o dinheiro da ajuda econômica na ponta final, dos empresários e trabalhadores.

“Ela é injustificável. Parece mais uma questão política, de fazer a população se alinhar com a ideia de que há necessidade de acabar com o confinamento”, afirma. Outra questão é a possibilidade de emissão de títulos pelo Banco Central. “É importante para dar liquidez ao mercado. Mas o BC tem que ser proativo e não reativo e é preciso um controle prévio das autoridades”, afirma.

Tenório acredita que a criação do orçamento, separando do que normalmente é feito, “dá transparência e visibilidade aos gastos feitos nesse período”. Outras medidas Especialistas ouvidos por LexLatin criticam a demora na adoção das medidas anunciadas e pedem mais incentivos de estados e municípios.

Na semana passada, foi anunciado o programa emergencial para manutenção de emprego e renda, que permite que patrões suspendam os contratos de trabalho dos empregados pelos próximos dois meses.

O governo se comprometeu a pagar, dependendo do faturamento da empresa, de 70% a 100% do seguro desemprego. Quem aderir ao programa não poderá demitir o funcionário nesse período. Outras medidas importantes foram o auxílio emergencial de R$ 600 a trabalhadores autônomos e informais; a linha de crédito para financiar a folha de pagamento de pequenas e médias empresas, que flexibiliza as regras trabalhistas em questões como banco de horas, férias e adiamento do pagamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) por 90 dias; e a Portaria 139, que prorroga o pagamento de alguns tributos federais como PIS e Cofins.

Para Gláucia Lauletta, sócia do setor tributário do escritório Mattos Filho, as medidas adotadas até aqui ajudam a manter o nível de emprego, o que pode diminuir o tamanho da crise num cenário depois da quarentena.

“As empresas precisam de liquidez nesse momento. Mas aconselhamos a não abrir mão dos empregados nesse momento. Num cenário de retomada, depois da quarentena, os empresários vão precisar de pessoas treinadas. Temos que acreditar que é uma crise passageira”, diz.

A tributarista defende mais medidas para as pequenas empresas. “Elas precisam de alívio e desoneração, de uma linha de crédito, incentivo e fomento para suas atividades e de alívio fiscal num curto prazo”, analisa.

A advogada defende mais medidas nos níveis estadual e municipal. “O ICMS por exemplo, é grandioso e mais oneroso do que a própria contribuição sobre a folha de pagamento ou Cofins”, afirma.

Jayme Freitas, sócio da área tributária do escritório Lefosse Advogados, explica que o governo está demorando para colocar em prática decisões que afetam a população e redução de tributos. “Não pode ser aos poucos, em conta gotas. Cada dia que passa são decisões sobre a vida e a morte. O governo federal vai precisar fazer um esforço ainda maior para estimular o caixa das empresas. Não adianta manter a cobrança de tributos, se as empresas vão quebrar”, diz.

O advogado também fala em medidas tímidas dos governos estadual e municipal até agora. Uma delas, da prefeitura de São Paulo, saiu na última sexta-feira (2).

\É o Decreto 59.326, que prorrogada por 90 dias a validade das Certidões Conjuntas Negativas de Débitos (tributos mobiliários e imobiliários) e das Certidões Conjuntas Positivas com Efeitos de Negativa (tributos mobiliários e imobiliários) emitidas pela Secretaria Municipal da Fazenda. O decreto também suspende por 60 dias o envio de débitos inscritos em dívida ativa, para fins de lavratura de protestos, aos Tabelionatos de Protestos de Letras e Títulos e a inclusão por 90 dias de pendências no Cadastro Informativo Municipal, o Cadin.

“Em muitos casos o contribuinte precisa buscar a via judicial, alegando princípio de caso fortuito e força maior, para justificar a redução da capacidade contributiva. Temos decisões favoráveis e desfavoráveis. Enquanto estado e municípios não adotarem medidas mais claras, a solução vai ser entrar na Justiça”, explica Freitas.

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